Publicado por Superior Tribunal de Justiça
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Coordenadoria da sexta Turma
(2699)
HABEAS CORPUS Nº 406.746 – BA (2017/0161666-7)
RELATOR : MINISTRO NEFI CORDEIRO
IMPETRANTE : JOSE MAURICIO VASCONCELOS COQUEIRO E OUTROS
ADVOGADOS : MAURÍCIO VASCONCELOS – BA010439 MILTON JORDÃO DE FREITAS PINHEIRO GOMES – BA017939
FABIANO VASCONCELOS SILVA DIAS – BA022716
ALOISIO FREIRE SANTOS – BA039758
RAFAEL FONSECA TELES – BA029116
IMPETRADO : TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA
PACIENTE : JOSÉ ROBERIO BATISTA DE OLIVEIRA
DECISÃO
Vistos, etc.
Trata-se de habeas corpus, com pedido de liminar, impetrado em favor de JOSÉ ROBERIO BATISTA DE OLIVEIRA, contra acórdão do Tribunal de Justiça do Estado da Bahia, nos autos da Ação Penal n.º 0000328-56.2016.8.05.0000.
Consta dos autos que o Paciente, Prefeito do Município de Eunápolis/BA, foi denunciado como incurso no art. 1.º, XIII, do Decreto-Lei n.º 201/67, em razão da contratação temporária de servidores para diversos cargos na Administração municipal, supostamente sem a
observância do disposto no art. 37, II, da Constituição Federal e no art. 13, III, da Lei Orgânica do Município de Eunápolis.
A denúncia foi recebida pelo Tribunal de origem, em acórdão assim ementado (fls. 16/17):
“AÇÃO PENAL ORIGINÁRIA. ART. 1°, XIII, DO DECRETO-LEI Nº 201/67. INÉPCIA DA DENÚNCIA. NÃO VERIFICADO. REQUISITOS DO ART. 41 DO CPP PREENCHIDOS. PRELIMINAR REJEITADA. AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA PARA DEFLAGRAÇÃO DA AÇÃO PENAL. NÃO DEMONSTRADA. JUÍZO POSITIVO DE ADMISSIBILIDADE DA DENÚNCIA. ANÁLISE DO ELEMENTO VOLITIVO. NECESSIDADE DE PRODUÇÃO PROBATÓRIA. DESNECESSIDADE DA PRISÃO PREVENTIVA E AFASTAMENTO CAUTELAR DO INDICIADO. DENÚNCIA RECEBIDA.
Denúncia formulada de acordo com os moldes estabelecidos pelo art. 41 do CPP, contendo a descrição do fato criminoso, com todas as suas circunstâncias, bem como a qualificação do denunciado, a classificação do crime, estando, ainda, acompanhada do rol de testemunhas. A denúncia não precisa ser demasiadamente extensa, devendo restringir-se ao indispensável à configuração da figura típica e demais circunstâncias que envolvem o fato, assegurando ao réu o exercício de defesa.
Não se pode falar em ausência de justa causa para ação penal quando a denúncia vem instruída com procedimento investigativo que apresenta indícios da ocorrência, em tese, do crime e de sua autoria.
O ato de recebimento da denúncia encerra cognição sumária, verifica-se, apenas, a plausibilidade da acusação, demandando cautela a fim de se evitar prejulgamento do mérito.
Questões envolvendo o elemento subjetivo do tipo somente levam à rejeição da peça inicial quando restar demonstrado de plano, mediante os elementos já constantes dos autos, que o fato não constitui crime.
Considerando a natureza dos fatos incriminados, bem como a documentação já acostada in folio, o afastamento cautelar do agente mostra-se desnecessário.
Do mesmo modo, ausente qualquer dos requisitos do art. 312 do Código de Processo Penal, não há que se adotar a medida extrema da prisão preventiva.
Preliminar rejeitada. Denúncia recebida.”
No presente writ, os Impetrantes alegam, em suma, a atipicidade da conduta atribuída ao Paciente, notadamente porque ” as contratações atribuídas ao Paciente, todas foram autorizadas por meio da Lei Municipal n.º 341, do ano de 1999 ” (fl. 5, grifos no original).
Requerem, liminarmente, a suspensão do trâmite da ação penal e, no mérito, o seu trancamento.
É o relatório. Passo a decidir o pedido urgente.
Em juízo de cognição sumária e prelibatória, não reputo configurado um dos requisitos
para o deferimento da medida urgente requerida, qual seja, o fumus boni iuris, notadamente porque foi ressaltado no acórdão impugnado que (fls. 24/25):
“[…] os elementos de informação produzidos apontam uma extensa lista com os nomes, os respectivos cargos e a data de admissão e/ou renovação de servidores que teriam sido contratados temporariamente para ocupar diversos cargos na administração municipal e indicam, a princípio, a inobservância ao art. 37, II, da Constituição Federal e art. 13, III, da Lei Orgânica do Município de Eunápolis, que proíbe contratações de servidores sem concurso publico, ressalvada a hipótese de necessidade temporária de excepcional interesse publico, na forma do art 192 da Lei Municipal n° 502/2004 , dentre as quais: “I – combater surtos epidêmicos; II -atender situações de calamidade pública; III- suprir necessidade de pessoal na área de magistério; IV – permitir a execução de obras e serviços ou técnicos; V – para atender a termos de convênios, acordos ou ajustes para execução de obras ou prestações de serviços, durante o período do convênio e seus aditivos”.
Não obstante, verifica-se que durante seu mandato de Prefeito de Eunápolis, o Denunciado contratou diversos servidores sem o devido concurso público, mais especificamente no ano de 2009, sob o título de contratação de necessidade temporária de excepcional interesse público, sem observar o quanto disposto no retromencionado artigo . Dentre as funções a serem exercidas por aqueles contratados sem concurso público, destacamos: auxiliar de secretária, auxiliar consultório dentário, auxiliar administrativo, auxiliar de serviços gerais, assistente social, agente administrativo, professor, vigilante, gari, cozinheira, motorista, coordenador de limpeza pública, supervisor de limpeza pública, enfermeiro, inspetor sanitário, farmacêutico, médico, técnico de enfermagem, auxiliar de enfermagem, técnico em raio-x, bioquímico, odontólogo, psicólogo, digitador, recepcionista, atendente, coveiro, até mesmo recreacionista.
Como se vê, os elementos de informação indiciários indicam, em tese, a tentativa de burla da regra do concurso público, pois,sequer os cargos relacionados pelo Denunciado, à exceção do de professor, subsumem-se as hipóteses constitucionais e respectiva regulamentação infraconstitucional , o que revela a ciência da ilegalidade das nomeações, afasta a tese defensiva de atipicidade da conduta uma vez que a Lei Municipal não autorizou a contratação direta dos cargos citados e, por conseqüência induz ao pleno conhecimento de todas as elementares do tipo penal, não havendo falar em erro de tipo quanto a elementar ‘contra expressa disposição de lei’.” (sem grifos no original.)
A propósito, cumpre ressaltar que a jurisprudência desta Corte é no sentido de que “[o] trancamento da ação penal em sede de habeas corpus é medida excepcional, somente se justificando quando demonstrada, inequivocamente, a absoluta ausência de provas da materialidade do crime e de indícios de autoria, a atipicidade da conduta ou a existência de causa extintiva da punibilidade […]” (RHC 43.677/SC, 6.ª Turma, Rel. Min. SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, DJe 05/06/2014).
No contexto dos autos, reserva-se ao Colegiado, órgão competente para o julgamento da impetração, a apreciação definitiva da matéria, depois de instruídos os autos.
Ante o exposto, INDEFIRO o pedido liminar.
Solicitem-se informações ao Tribunal de Justiça do Estado da Bahia.
Após, ouça-se o Ministério Público Federal.
Publique-se. Intimem-se.
Brasília (DF), 16 de julho de 2017.
MINISTRA LAURITA VAZ
Presidente